O Seculo XVII, o "desenho miúdo" e as influências que chegaram da China

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Mosaico 01 p

A Louça de Coimbra não tem conseguido, por várias razões que merecem análise, atingir os favores da atenção dos meios mais especializados que transformam certos produtos aparentemente simples em objectos de culto, coleccionismo, devoção e transacção dignificada.
Há qualquer coisa de excessivamente familiar, uma proximidade sentimental que sufoca o sentido de segredo das coisas selectas. Por outro lado a vitalidade e a concreta juventude de muitos dos seus executantes, tornam a presença destes objectos numa aquisição que podemos adiar para amanhã, ou para depois.
Eles estarão sempre ali e nós bem podemos adiar este amor que só na altura estratégica de uma prenda de oportunidade se fará valer.
Às vezes pergunto-me se tais razões serão necessárias para explicar o motivo dessa subalternidade e se tudo não passa simplesmente de uma tremenda falta de atenção, uma pobreza interior que nos leva a ignorar coisas preciosas apenas porque nos são familiares.

13 a Mos AD p

Estas duas peças que aqui se encontram fotografadas de diversos ângulos evidenciam um conjunto de dispositivos de caracterização plástica perfeitamente típicos deste tipo de faiança decorativa.
A hierarquização do espaço decorativo é efectuado pela inclusão de frisos, faixas, cadeias ou simples juntas de separação que, em alternância de tonalidades, conferem à peça a sua “solidez” expressiva, numa evidente preocupação de ocupar todo o espaço disponível.
As reservas centrais, delimitadas por dispositivos de configuração geométrica, revelam a palpitante “paisagem” orientalista saturada de ramificações, flores e vegetalismos diversos no seio da qual evoluem os conhecidos protagonistas tradicionais, que a tradição dos nossos artífices associa à sua cultura campestre e cinegética mas cujo significado, na matriz de remotos imaginários bem identificados pela cultura chinesa, há muito se perdeu na distância. 

Na peça de cima, no suporte e na borda, aparece a chamada “faixa barroca”, enrolamento em volutas de folhas estilizadas, referida como sendo a vertente ocidental deste tipo de decoração tão fortemente influenciada pela porcelana importada da China no Sec. XVII, no período final da dinastia Ming. Reinaldo dos Santos, no entanto, na sua obra “Oito Séculos de Arte Portuguesa, História e Espírito” refere que:

“…são frequentes as orlas decorativas citadas como frisos barrocos, mas na realidade são de origem chinesa da época Chia-Ching. O termo de barroco pode prestar-se a mal-entendidos, melhor seria chamar-lhes “ramos ondulantes…”.

Não me sinto capaz de arbitrar esta questão mas, entre “faixa barroca” e “ramos ondulantes” a minha preferência vai claramente para esta última expressão, muito menos comprometida com fórmulas culturais estereotípicas e mais de acordo com a íntima respiração das forças naturais…

As peças aqui representadas foram executadas pelo meu amigo e artista António Dias Salgueiro Póvoa, de Sobreiro, Condeixa-a-Nova. 

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